Pular para o conteúdo principal

Resposta ao Stein I: salário-eficiência

Stein dos Rabiscos, com sua eloqüência e conteúdo habituais, criticou duramente meu post recente. Vamos por partes, começando pelo salário-eficiência.

A idéia de que o salário-eficiência é uma situação que se sustenta no equilíbrio é uma idealização. Parte do pressuposto implícito de que não exista uma competição entre os trabalhadores empregados e os desempregados. Os desempregados que realmente quisessem trabalhar estariam dispostos a assinar contratos que garantissem sua produtividade. Além disso, se os trabalhadores não querem produzir a quantidade “X” ao salário “Y”, eles se enquadram na categoria de desemprego voluntário, ou seja, não fazem parte do desemprego do qual Keynes falava. Portanto, os salários são flexiveis e o que a teoria do salário-eficiência descreve é apenas um dos motivos pelos quais os trabalhadores decidem não trabalhar.

Segundo Romer (2005), cap. 9, o qual trata do desemprego, a hipótese fundamental tanto no modelo básico de salário-eficiência como no modelo de Shapiro-Stiglitz é que há um problema de monitoramento do esforço, o que é importante uma vez que a produção da firma é também função do esforço do trabalhador [F(eL)]. Em nenhum momento que eu me lembre, conjectura-se sobre alguma hipótese de que não há competição entre trabalhadores. Em particular, o modelo de Shapiro-Stiglitz destaca que não se esforçar no trabalho e ser pego implica em demissão, levando à contratação de outro trabalhador (uma vez que assume-se já existir desemprego na economia). Dado o problema de monitoramento, a firma paga um salário mais alto que o de equilíbrio Walrasiano, diminuindo o incentivo do trabalhador a não se esforçar. E não é que no mundo vemos trabalhadores esforçados e preguiçosos?

É claro que abstração sempre existe. O que afirmei no meu post anterior refere-se ao grau de abstração. A suposição de custo de monitoramento é uma tentativa de tentar incorporar melhor um problema do mundo real, que não nega princípios econômicos mais abrangentes aprioristicamente definidos. Apenas mostra outros fatores que impedem que o ajustamento seja perfeito, como dito pela teoria econômica - embora possamos dizer que suas leis sejam ainda válidas, caso assim queiramos. Modelos de salário-eficiência nada têm a dizer sobre isso. A gravidade continua acelerando a 9,8m/s. Isso não significa que a pedra necessariamente caia obtendo tal aceleração em virtude de outros fatores (resistência do ar, por exemplo). Se a Física ignorasse isso, não existiria aerodinâmica. É da mesma forma que considero o modelo de salário-eficiência novo-keynesiano: não nega leis de mercado, mas considera outros fatores relevantes.

Lembremos também que novo-keynesianismo é ortodoxia. Depois falo mais sobre matemática, ortodoxia e retórica.

PS: Misturar praxeologia com economia neoclássica é perigoso, principalmente se o leitor ortodoxo gostar de Popper.

Comentários

Guilherme Stein disse…
A resposta está sendo fabricada.
Mas eu aguardo as outras partes!

Postagens mais visitadas deste blog

Lutero e os camponeses

São raros os momentos que discorro sobre teologia neste blog. Mas eventualmente acontece, até porque preciso fazer jus ao subtítulo dele. É comum, na minha condição declarada de cristão luterano, que eu sempre seja questionado sobre as diferenças da teologia luterana em relação às outras confissões. Outra coisa sempre mencionada é o episódio histórico do massacre dos camponeses no século XVI, sancionado por escritos de Lutero. O segundo assunto merece alguma menção. Para quem não sabe (e eu nem devo esconder isso), Lutero escreveu que os camponeses, que na época estavam fazendo uma revolta bastante conturbada, deveriam ser impedidos de praticarem tais atos contrários à ordem - inclusive por meio de violência. Lutero não mediu palavras ao dizer isso, o que deu a justificativa para a violenta supressão da revolta que ocorreu subsequentemente. O objetivo deste post não é inocentar Lutero do sangue derramado sobre o qual ele, de fato, teve grande responsabilidade. Nem vou negar que Lutero ...

Endogeneidade

O treinamento dos economistas em métodos quantitativos aplicados é ainda pouco desenvolvido na maioria dos cursos de economia que existem por aí. É verdade que isto tem melhorado, até porque não é mais possível acompanhar a literatura internacional sem ter conhecimento razoável de técnicas econométricas. Talvez alguns leitores deste blog ouçam falar muito em endogeneidade ou variáveis endógenas, principalmente no que se refere a modelos econométricos. Se pensamos em modelos de crescimento endógeno, o "endógeno" significa que a variável que causa o crescimento é determinada dentro do contexto do modelo. Mas em econometria, embora não seja muito diferente do que eu disse na frase anterior, endogeneidade se refere a "qualquer situação onde uma variável expicativa é correlacionada com o erro" (Wooldridge, 2011, p. 54, tradução livre). Baseando-me em um único trecho do livro do Wooldridge (Econometric Analysis of Cross-Section and Panel Data, 2 ed, 2011, p. 54-55) ...

Exogeneidade em séries de tempo

Mais um texto de quem tem prova de econometria na segunda-feira. Quem não é economista não deve de forma alguma ler esse texto. Não digam que eu não avisei. Quando falamos de exogeneidade na econometria clássica, estamos falando da chamada exogeneidade "estrita", que nada mais consiste no fato de uma variável x não ser correlacionada com qualquer erro. Nas séries de tempo, no entanto, trabalha-se com três tipos de exogeneidade, dependendo do fim proposto. Na busca de resultados em inferência estatística (modos de estimar parâmetros e formulação de testes de hipótese), utiliza-se, em séries de tempo, o conceito de exogeneidade fraca. Para isso, precisamos 'fatorar a função de distribuição em duas partes: distribuição condicional e distribuição marginal . Define-se que uma variável é fracamente exógena em relação aos parâmetros de interesse se, e somente se, houver um certo tipo de reparametrização e atender duas condições: a variável de interesse precisa ser função de apen...