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Produto marginal ou valor-trabalho?

No capítulo intitulado "Class, Gender and Other Groups" do famoso livro "Inequality Reexamined", Amartya Sen (1992) discorre um pouco sobre um velho debate na história do pensamento econômico: quem afinal foi responsável pela produção? E quem merece receber a remuneração advinda dessa produção? Segundo Sen:

Production is an interdependent process involving a joint use of many resources, and there is in general no clear way of deciding which resource has produced what. The concept of 'marginal product' of a resource is not really concerned with who has 'actually produced' what, but with guiding the allocation of resources by examining what would happen if one more unit of a resource were to be used (given all the other resources). To read in that counterfactual marginal story (what would happen if one more unit were applied, given everything else) an identification of who has 'in fact' produced what in the total output is to take the marginal calculus entirely beyond its purpose and depth.


Mas se os marxistas pensam que escaparam, continua Sen:

This problem of identification (who has produced what) applies to Marx's theory of exploitation as well - perhaps even more strongly, since the non-labour resources are treated in a very limited way. (p. 121)

Reações?

Comentários

Thiago disse…
Oi Thomas, blz?
Cara, eu me lembro de ti (mais de vista mesmo) lá da Economia. Apesar da gente quase nunca (ou seria nunca mesmo?) ter se falado, temos vários amigos em comum, especialmente o Martini. De vez em quando costumo dar uma olhada no blog do Martini e ali eu descobri o teu. Tchê, teu blog é muito bom. Seguidamente tu tem uns posts bem interessantes, como esse de agora. Influenciado pelo Martini e por outros amigos, acabei de criar um blog tb. Se tu não se importar, vou colocar um link do teu lá no meu.

Quanto às pessoas fantasiadas de zumbis que tu viu e descreveu no post anterior, é um daqueles eventos que o pessoal organiza pela internet. Já aconteceu um evento assim em Porto Alegre. Os "zumbis" se reuniram na Redenção e foram até o Praia de Belas, se não me engano. Saiu uma nota na Zero Hora e eu vi também o site do evento! Acho que é meio que um movimento mundial de zumbis, hehehe.

Abraço!
Wander disse…
Apesar de velha, nunca havia meditado sobre essa questão. Supondo correta a observação de Sen que tanto a teoria do valor-trabalho quanto a teoria da firma erram na avaliação de qual fator é responsável pela produção, acredito que isso se deve ao fato dessa questão não ser crucial para determinar como o produto é distribuído gerando a conseqüente remuneração de fatores. Com relação à desigualdade, conhecemos o aparato desenvolvido por Marx para explicar como o trabalhador foi subjulgado pelos meios de produção. Por outro lado, a microeconomia tradicional se limita a igualar salário e (valor do) produto marginal e, quando isso não acontece, justifica-se com falhas de mercado (sindicatos? risco moral?).
Thomas H. Kang disse…
Acho que o ponto de Sen é dizer que não tem como sabermos, pelo menos através dessas teorias, quem são os responsáveis pela produção. Conseqüentemente, pior ainda é fazer considerações sobre justiça distributiva a partir disso.
Anônimo disse…
'Os fudamentos macroeconômicos da microeconomia marxista, estebelecem que em cada unidade produtiva se condensam e se materializam as contradições derivadas do conflito distributivo pelo valor excedente (mais-valia) gerado no fluxo anual de produção de riquezas. Além disso, como Ricardo, Marx diferencia as forças produtivas de riquezas materiais (os fatores de produção, inclusive o trabalho) e as forças produtivas de valor (tempo de trabalho gasto na produção). O valor-trabalho é uma unidade de medida do trabalho humano empregado no processo de produção que tem a propriedade de produzir, quando combinada a outros fatores, um valor superior ao seu próprio valor. Isso se dá pois usualmente a jornada de trabalho dos individúos é superior ao tempo de trabalho gasto para produzir a cesta de bens que os subisitem, surgindo daí um difenecial entre o valor pago ao trabalho e o valor produzido pelo trabalho, ou seja, a mais valia. A exploração não é uma proposição normativa, moral, mais apenas denota um mecanismo sistemático de distribuição da riqueza gerada denominadas em termos de trabalho, esta exploração se dá pois há uma profunda desigualdade na dotação fatorial entre os individúos, pois enquanto uns tem além de sua própria força de trabalho, detém o comando econômico sobre os meios de produção e os outros (os trabalhadores), somente tem sua força de trabalho. A assimentria dos primeiros em relação aos segunda é agravada, pois o controle doe meios de produção, concentra o processo de tomada de decisão de forma plutocrática na figura dos diretores e proprietários das firmas.
O valor-trabalho é uma unidade de medida que homogeniza o sistema econômico e propiciam a comensurabilidade dos bens e serviços de uma economia. Os preços são nada mais do que "valores relativos", ou seja, é o tempo de trabalho gasto em uma mercadoria comparada ao tempo de trabalho gasto para produzir uma unidade monetária. A teoria do valor-trabalho também tema vantagem de quantificar o custo da produção social tanto para os capitalistas (em termos de preço dos fatores) e para os trabalhadores (em termos de tempo).
Thomas H. Kang disse…
Obrigado pela definição, caro anônimo. Ela é bastante conhecida, mas é sempre bom lembrar para o leitor menos a par da situação.

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