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Auto-interesse e individualismo metodológico

Quem tiver acesso ao jornal Valor, conferir na edição de hoje a coluna de Ricardo Abramovay sobre o livro "The Idea of Justice" de Amartya Sen.

Temos discutido até que ponto reconhecer motivações além do auto-interesse (por exemplo, simpatia ou compromisso - as clássicas categorias do artigo de 1977 de Sen, "Rational Fools" da Philosophy and Public Affairs) realmente significam afastamento de individualismo metodológico, como o próprio autor parece defender em seu livro.

Lembro que um defensor do individualismo metodológico, Max Weber, costumava colocar entre as motivações da ação humana não apenas a categoria zweckrational (racionalidade instrumental), como também a categoria wertrational (racional de valor). Compromissos éticos poderiam entrar nessa categoria.

No final das contas, qual a relação entre auto-interesse e individualismo metodológico? Eu acreditava que eram coisas distintas. Agora estou na dúvida.

Comentários

o tchê Thomas:
pelo Aurelião, interesse é "sentimento de zelo, simpatia, preocupação ou curiosidade por alguém ou alguma coisa" e método é "caminho pelo qual se atinge um objetivo", posso ser auto-interessado e nunca buscar explicações para fenômenos individuais ou sociais. e posso buscá-las mesmo sendo autruista.
DdAB
henrique disse…
Confesso que vim para o seu blog justamente para te perguntar isso: a posição de Sen é mesmo de crítica ao individualismo metodológico? O que o prof. Abramovay atribui como uma violação desse princípio é simplesmente o fato de que as preferências dos indivíduos não se restrinja apenas ao seu próprio interesse. Isso, para mim, nem de longe se parece com uma violação do individualismo metodológico (nem me parece ser um problemqa para teoria micro tradicional). O que achas?

Dejanir Henrique
Thomas H. Kang disse…
Pois é, Duílio, eu concordava até discutir com o Abramovay e ficar na dúvida.

Dejanir: de fato não me parece. Aqui vai o trecho de Sen em que ele parece dizer que não esposa o individualismo metodológico (The Idea of Justice, p. 245):

"The presence of individuals who think, choose and act - a manifest reality in the world - does not make an approach methodologically individualist. It is the illegitimate invoking of any presumption of independence of the thoughts and actions of persons form the society around them that would bring the feared beast into the room".

Não sei em quem Sen está se baseando na sua definição de individualismo metodológico. Se levar em conta a sociedade em volta é contrariar o individualismo metodológico, talvez o prof. Abramovay tenha um pono. De qualquer forma, isso não parece, na minha opinião, coerente com as ideias originais de Weber a respeito do tema.

Sen indica a seguinte bibliografia: Steven Lukes, [i]Individualism[\i] (Oxford: Blackwell, 1973) e "Methodological Individualism Reconsidered", [i]British Journal of Sociology[/i], 19 (1968).

Minha opinião ainda estaria de acordo com a do Dejanir, pelo menos até agora.

O problema de Sen com a micro tradicional parece derivar-se menos do individualismo metodológico, mas ao foco exclusivo nas utilidades. Mas isso é outro papo - e mais relacionado a economia do bem-estar.

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